A
novidade no Rio Grande do Sul
Zênia
de León
Reportemo-nos de
início aos primeiros bondes, ao tempo em que não havia energia elétrica na
cidade. Um contrato firmado entre o presidente da província, conselheiros da
Companhia Ferro Carril e Cais de Pelotas, os diretores João Frederico Russel,
Francisco Figueiredo e Manoel
Marques de Sá, tratava de um serviço de transporte coletivo
urbano. A firma concessionária se comprometia a instalar em todas as vias de
limite urbano e seus subúrbios, linha de carris de ferro, tanto para passageiros
como para carga, por tração animal ou a vapor. O sistema seguiria o modelo
usado no Rio de Janeiro e Jardim Botânico, e duraria 50 anos, com repasse de
3.000$000 destinado às obras.
Os bondinhos à tração animal serviram à desenvolvida
Pelotas. Os trilhos passavam em frente à intendência e à biblioteca Pública.
Foi em 9 de
novembro de 1873 que os bondes foram entregues ao público. Uma novidade. Agora,
nem só as carruagens levavam as pessoas pela cidade. Aqueles burrinhos
pachorrentos fizeram trafegar as viaturas sobre os trilhos durante mais de vinte
anos até que se cogitou da substituição por bondes elétricos. Na foto, os
trilhos que passavam em frente à intendência e à biblioteca Pública, esta então
com um andar somente, e os bondinhos eram a base do novo transporte. O sistema
de transporte serviu à cidade por 42 anos e a Rio Grandense Light & Power Syndicate
LTD, registrava em Londres, em 17/05/1912, que havia instalado a iluminação
pública elétrica em Pelotas, em 1914, iniciando a construção da primeira linha
de bondes elétricos junto a empresa argentina Buxton, Cassini & Compañia,
de Buenos Aires, que começou a funcionar em 29 de outubro de 1915.
Os bondinhos à tração animal na histórica e saudosa
entrada do parque Souza Soares, no Fragata.
Fato
interessante ocorreu quando a princesa Isabel em visita a Pelotas, em 1885,
passeou com seus dois filhos em um bondinho puxado a burros. Como em todo o
lugar por onde andava a nobre senhora, faziam-se manifestações de simpatia e às
vezes um tanto exageradas. Os pelotenses, dados a homenagens, não fizeram
diferente. Ornamentaram o bondinho com flores para os reais passageiros que os
levaria ao parque Sousa Soares, o primeiro centro turístico do Rio Grande do
Sul.
Bondes assim
circularam em Pelotas até 1955
O bonde tipo
Imperial que circulou em Pelotas a partir de 1915.
O bonde de dois
andares entrando no parque Souza Soares, apinhado
de gente
Os bondes de
dois andares implantados em Pelotas, segundo pesquisador Allen
Morrison-Londres, foram possivelmente os maiores já operados no Brasil, maiores
que os ”Imperiais” de Porto Alegre quando, em março de 1920 a RGL&RS encomendou
dois bondes de dois andares Birney, que foram os menores já operados no Brasil.
A Pelotas
Tramways Co., que operou o sistema para RGL&PS, foi adquirida pela Eletric
Bond & Share, atou em Pelotas com o nome de Empresa Elétrica Rio Grandense.
Em 1922, os
bondes de dois andares foram reconstruídos como veículos de um andar apenas -
Morrison-Allen, New York.
O fornecimento
de energia elétrica ocorreu depois de uma negociação com a The Riograndense Light
& Power S.l., somente em 27 de agosto de 1915, quando os bondes chegaram
via fluvial, pelo vapor Itaqui, contendo 28 volumes e logo se deu a
inauguração, a 16 de outubro, com bondes repletos de gente que fizeram o
percurso da Estação Férrea, pela rua D.Pedro II, até a rua 15 de Novembro.
Uma
festa!
O público, já cansado do que chamavam de lerdos, obsoletos e
desprezíveis bondes puxados a burrinhos, satisfaziam-se contentes pelos
modernos e higiênicos bondes, deslumbrando-se com o ruído sonoro do sininho que
tocava. A inauguração propriamente dita ocorreu em 20 de outubro daquele ano
com 114 viagens, transportando 3.794 pessoas, a 200 réis cada uma.
Nesse
início, trafegavam cinco bondes da fábrica “Brush”, tipo fechado, e outros três
tipo “Imperial”, de dois andares. Estes últimos faziam a linha Fragata, o
bairro mais populoso e movimentado da cidade pela presença do prado, do cemitério,
do parque Ritter com suas retretas aos domingos e o seu “bosque Champs Elisée”;
do parque Souza Soares, a maravilha de recreação para toda a família. Era lá
que se realizavam retretas com algumas bandas civis, sendo que a Banda
Democrata usava um bonde especial no qual colocara-se uma enorme figura de lira
na fachada.
Tudo era festa.
Tardes movimentadas obrigavam um leva-leva e um
leva e traz gente quando os bondes serviam incessantemente aquela mania de se
divertir.
A implantação dos bondes se deve também ao intendente Cipriano
Barcellos e as linhas foram se ampliando por todos os bairros.:
Linha do Porto,
entre extremos Porto, praça Julio de Castilhos (parque D.Antônio Zattera), nos
dois sentidos;
Linha Fragata - Bondes Imperial- de dois andares entre praça da
República (Cel.Pedro Osório), e Fragata, na estrada do Salso e vice-versa.
Nesta linha, os bondes faziam todo o percurso indo até dentro do parque
Pelotense;
Linha Três Vendas, da mesma praça central e a Casa Wickboldt, o
ponto terminal da primeira estação da linha número 5, conforme assegurava o
contrato.
E havia a Linha Areal que descia a rua Rafael Pinto Bandeira, fazendo
curva na rua Dr. Fagundes, dobrando na Av. Domingos
de Almeida, até imediações da cacimba das Nações, o fim da linha.
Havia
famílias inteiras que usavam o bonde aos domingos no verão para irem à “prainha”,
costa do arroio, à direita da ponte, pela estrada da Costa, além da desativada
charqueada de Domingos de Almeida. O
sitio do Laranjal ainda não tinha sido aberto ao povo.
Os bondes:
3 carros motores
Imperial - de 15 toneladas
-Dois andares;
3 carros transformadores semi-imperial;
5 carros Bush de 11 toneladas;
6 carros reboques; 1 plataforma; 1 zorra a
motor.
Os carros eram
distribuídos da seguinte forma:
Linha do Porto -
3 carros em cada sentido; Linha Três Vendas - 2 carros em cada sentido;
Linha
do Parque e Fragata - 3 a
4 carros. Além dessas linhas, obedecendo
a horários especiais, um carro circular e Estrada de Ferro, quando se observava
excesso de passageiros.
Criou-se uma linha de bondes que se deslocava da usina
até ao Clube de Regatas Pelotense, pois intensificava-se a freqüência desse
clube fundado em 1875 (Pelotas,casarões contam sua história-3º Volume, de
León-Zênia), com torneios de barco e natação.
Linhas auxiliares e ramais como a
linha que passava em frente ao teatro Guarani para o público dos bairros que
vinha para os espetáculos. O que entendemos é que os bondes serviam e atendiam
às necessidades da população, representando grandes expectativas de crescimento,
modificando o aspecto da urbe. Aquele barulho de rodas sobre os trilhos era
gostoso pois representava progresso e vida.
O povo vivia satisfeito e feliz com
os transportes. Não havia acidentes, nunca se ouviu falar em mortes no
trânsito.
Veja o leitor o entrevero de veículos na foto que segue abaixo, sem
leis de trânsito, que não as havia: são bondes e carroças ainda
pessoas no meio da rua. Tudo muito tranqüilo
Ao fundo à direita, o bonde de dois andares que
fazia a linha Fragata, atravessando pela
rua Mal.Floriano.A foto é uma reprodução de um cartão postal impresso pela
Livraria Universal, de Echenique & Cia.
Rua 15 de novembro, esquina Floriano.
Observe atentamente os detlhes.
Á esquerda da
foto, observe-se a traseira do bonde de dois andares. Em destaque a escada em
caracol por onde os passageiros subiam, e o balcão/retaguarda, onde se encosta o
fiscal de uniforme branco. Esquina Mal.Floriano com rua 15 de Novembro,em
frente à residência do Sr. Antônio Assumpção. Na calçada oposta, a Casa Coate (Hoje
está o Banco Itaú) com um sistema de publicidade sobre a platibanda que
anunciava “HOJE GRANDES FESTAS no S.C. PELOTAS”.
O Bonde de dois
andares vinha do Fragata pela rua Mal.Floriano e parava na rua 15 de Novembro.
Dalí voltava para o bairro novamente. Carruagens de aluguel aguardavam
passageiros ao lado da praça. Eis uma cena comum.
“O sistema de
bondes foi encerrado em abril de 1955, não deixando vestígios físicos na
cidade” (Carlos Pimentel-História dos bondes). Tem-se noticia de que em certo
tempo o Clube Gonzaga exibia em seus jardins um exemplar de um bonde que, aos
poucos, por falta de manutenção deteriorou-se, não restando nada que memória e
saudade.
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ZÊNIA DE LEÓN -
Escritora/pesquisadora.
Fale Conosco : pelotasdeportasabertas@hotmail.com