SEXO & SAÚDE
O medo, a dor e o prazer
Incômodo na hora da penetração atinge pelo menos 15% das mulheres brasileiras e pode ser de fundo emocional
Laura Muller - colunista do Globo.com
Uma parcela das mulheres da atualidade ainda se vê às voltas com uma dificuldade antiga, do tempo em que sentir desejo sexual e prazer era algo totalmente proibido à população feminina. É a dor na penetração, que atinge pelo menos 15% das brasileiras, segundo estudos de sexólogos nacionais. Por que será que essa dificuldade ainda atinge e frustra tanto os casais? Há como reverter a situação?
Esse tipo de pergunta costuma ser feita nos consultórios por mulheres que já examinaram seu corpo de todas as formas, sob orientação médica, e não encontraram causas físicas que justificassem a dor. Seria a anatomia feminina que, para algumas, tem algo de errado e faz com que as paredes da vagina fiquem coladas ou parcialmente fechadas na hora do sexo, impedindo o prazer? Não, em geral não é isso. Após a peregrinação aos médicos, o diagnóstico é certeiro: a dificuldade é emocional.
E tem remédio para isso? Essa é a questão mais simples e, ao mesmo tempo, complicada de responder. A resposta simples é dizer que remédio milagroso para isso não tem, infelizmente. Ainda não descobriram uma pílula capaz de relaxar a mulher o suficiente para entrar no clima erótico e se estimular a ponto de a vagina naturalmente se alargar, aprofundar e lubrificar para receber o pênis sem dor. A parte complicada é entender como promover mudanças emocionais que acabem de vez com esse terrível incômodo, que não deveria existir, na hora da penetração.
A complexidade psicológica de cada uma de nós é imensa. A começar pelos motivos que podem desencadear dificuldades dessa magnitude na cama. Dá para apontar algumas hipóteses. Uma delas: a mulher pode ter sido criada com a visão do passado de que sexo tem algo de “errado”, “sujo” e “feio”, e que quem faz está correndo uma infinidade de riscos, entre eles o de se contaminar com todas as doenças do mundo, além da temível possibilidade de engravidar. Que a camisinha pode não ser tão segura como falam. Que a pílula anticoncepcional pode falhar justo com você. Que o parceiro pode sumir do mapa depois de conseguir transar. Que seu corpo vai mudar depois da primeira vez e todas as pessoas vão perceber que você fez algo que não deveria. Enfim, que sexo faz mal e ponto.
Ir para a cama com tudo isso na cabeça é cruel. Por mais que a mulher tente fazer de conta que está tudo bem e que o importante é o prazer do momento, não dá para se sentir verdadeiramente assim. E aí as coisas complicam bastante, o desejo começa a ir embora... E o medo se instala!
Medo de quê? De doer, obviamente. Mas não só: também de frustrar o parceiro, de não ser “mulher o suficiente” para ele, de ter algum defeito, de ser trocada por outra, de ser um completo fracasso erótico. A próxima ida para a cama é invadida agora por mais uma lista de pensamentos cruéis e fatais ao prazer, elencados pelos variados temores e preocupações que não param de emergir no universo de quem sente dor.
E o parceiro? Alguns entendem a dificuldade e se solidarizam com a questão. Outros não conseguem enxergar dessa forma e muitas vezes se irritam com a indisponibilidade feminina. Será que ela não gosta de sexo? Ou o problema dela é comigo? Essas e outras questões surgem na cabeça, e muitas vezes na fala, de quem está ao lado da mulher com dor.
Fazer o quê? Será preciso investigar quais medos andam pairando na cabeça e dar novos significados ao sexo, até então visto como o canalizador do que há de pior no mundo. O apoio psicológico de um especialista pode ajudar. No entanto, com ou sem psicólogo ao lado, o principal é procurar entender a si mesma, se perdoar e se abrir a uma nova e prazerosa história.