Pesquisar aqui

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

REITOR BACHETTINI FALA SOBRE OS DESAFIOS DA UCPel

Os desafios da UCPel
Reitor José Carlos Bachettini Júnior fala sobre sua administração frente à universidade

Com conteúdo do Diário Popular - Diego Queijo

Foi no dia 30 de janeiro de 2012. Naquela segunda-feira, quando José Carlos Bachettini Júnior sentou-se na confortável cadeira da sala da Reitoria da Universidade Católica de Pelotas (UCPel), já sabia dos desafios que encontraria pela frente. Ele deixou para trás o cargo de vice-reitor e, naquela segunda-feira, dois dias após a cerimônia de posse, Bachettini passava a ocupar o cargo máximo na administração da instituição.

O arcebispo de Pelotas e chanceler da UCPel, dom Jacinto Bergmann, foi quem o designou ao cargo. O novo reitor assumiu no lugar de Alencar Mello Proença, que atuou no posto durante 12 anos. Vinte e quatro meses depois de tomar posse, o planejamento e a transparência já podem ser considerados marcas fortes da gestão.

Foi para falar sobre esse e outros temas que Bachettini recebeu a reportagem do Diário Popular. Com os dados da Universidade em mãos - detalhados em planilhas -, diante das questões levantadas o reitor mostrou-se um homem bastante sensato e com total consciência e lucidez de seus atos. E do tamanho do impacto que podem ter para a instituição.

Médico, ex-aluno da UCPel e ex-diretor do Hospital São Francisco de Paula, Bachettini diz ser um tímido torcedor do Xavante e possuir certa dificuldade para discursar diante de grandes aglomerados de pessoas. Sem aspirar a cargos públicos, afirma que o compromisso com os interesses da Universidade deve permanecer à frente de interesses pessoais. E frisa: com o planejamento estratégico e o aumento do controle dos processos internos na instituição, a UCPel está em processo de recuperação financeira. Em 2021, todo endividamento bancário - cujos valores não foram revelados por uma questão de mercado - estará pago.



Em janeiro último, Bachettini foi reconduzido à liderança da UCPel por mais dois anos. Entre as principais ações para o próximo período está a implantação do Planejamento Estratégico para 2032, com base no diálogo entre qualidade, sustentabilidade e identidade cristã.

Começo

“Depois da posse a primeira ação foi estabelecer uma análise dos cenários que nos cercam localmente, regionalmente, nacionalmente e até quanto à internacionalização da Universidade. Depois fizemos um diagnóstico interno. A partir daí pensamos na recuperação em um plano de longo prazo. O imediatismo não resolve o nosso problema. O conceito de governança é novo dentro da instituição. Isso significa, por exemplo, auditoria independente o tempo todo, transparência, cumprimento de metas e distribuição desses resultados para os conselhos que regem a Universidade. Então passamos a construir um plano audacioso que projeta 20 anos da Universidade. A primeira etapa foi sensibilizar as pessoas, porque não estávamos acostumados a trabalhar com planos. Sempre que tinha um problema ele era resolvido. Mas nós nunca colocávamos esse problema em um processo para que ele não ocorresse mais. A sensibilização das pessoas ainda não está fácil. Mas determinamos estratégias, montamos as diretrizes e partimos para a implantação. Hoje o plano está 90% implantado.”

Equilíbrio e sustentabilidade
“O termo que nos machuca perante a comunidade é a sustentabilidade. Sem sustentabilidade, nós seríamos gestores irresponsáveis. Hoje não se abre turma com menos de 85% de alunos porque, mais grave do que ter o desgaste com alunos, é não poder cumprir o projeto pedagógico do curso. Acho que isso é uma irresponsabilidade de qualquer gestor. Como isso é uma quebra de cultura, quem tá sentado aqui agora (como reitor) está pagando esse preço de imagem pessoal e institucional. Mas o motivo dessa decisão é que o bem maior tem que se impor, e a nossa prioridade é o aluno. Em 2010 fizemos estudos baseados no conceito do Ebitda (lucros antes de juros, impostos, depreciação e amortização) e o resultado era negativo: -9,3. Hoje é positivo em +2,5. Isso quer dizer que se eu tirar as dívidas, a Universidade é um grande negócio. Ela se sustentaria. Nós precisamos é pagar essa conta. Para que isso aconteça, vários ajustes são feitos. De quatro cursos superavitários, hoje já temos oito. É pouco, mas é o começo de uma caminhada.”

Dívidas
“Meu primeiro grande desafio foi reestruturar o endividamento da Universidade. Em 2012 renegociamos com 12 instituições financeiras, com Imposto de Renda, Fundo de Garantia e INSS. Posto isso, temos que pagar a conta. É uma posição estratégica (não divulgar o valor), porque parece que não tem mais solução. Mas tem solução. Nessa perspectiva que foi montada, no ano de 2021 pagaremos todo o endividamento bancário. Em 2026 terminaremos de pagar todo o endividamento fiscal e tributário. Hoje as contas estão quase equilibradas, ainda temos déficit de caixa, mas é bem menor do que quando assumi.”

Processo de endividamento
“Credito um pouco ou bastante disso ao trabalho com caixa único. No caixa único eu não tenho controle de quem está contribuindo e quem está só retirando. Quando eu passo a trabalhar com unidades, eu também começo a ser mais justo. Por exemplo, tem um curso da Universidade que é muito superavitado. Aí tu imaginas eu pegar dinheiro dele e colocar em outro. Quando eu olho, aquele curso que era superavitado está sucateado e aí eu perco o controle do todo. Por isso começamos a trabalhar com essa divisão. Hoje a Universidade se mantém com a parcela dos alunos, empréstimos, negociações com fornecedores e renegociamento de dívidas.”

Identidade cristã
“A Católica é plural nas convicções religiosas. Aqui não se faz diferença de credo nenhum. Isso gera certa dificuldade em relação à identidade cristã. Então o que utilizamos é o diálogo. E temos promovido ações que fortalecem essa identidade. Mas não é simples. Ainda possuímos dentro da matriz curricular três disciplinas de formação humanística muito fortes. Alguns grupos de alunos ainda acham que são disciplinas “caça-níquel”, mas elas contribuem com a formação humana. Também 20% da carga horária pertence a um cardápio que não foi ainda bem entendido pelos alunos. São as atividades complementares e servem para melhorar ou qualificar a formação. Mas esse processo de transformação não acontece de um dia para o outro. É um processo contínuo. Mesmo com projeto audacioso, é preciso pensar em pedaços. Uma Universidade Católica não pode instrumentalizar o diploma. Ela tem que ter algo mais. Eu tenho que formar um cidadão.”

Relação com a saúde municipal
“A saúde é uma das fortalezas da Universidade. Temos o Hospital Universitário São Francisco de Paula. Além disso, hoje quatro Unidades Básicas de Saúde são de responsabilidade da Católica e conseguimos fazer investimentos no Campus da Saúde. Mas há sempre um conflito entre a relação técnica da saúde com a relação política. E esse divisor - que sempre vai existir - não pode gerar tanto conflito a ponto de piorar a situação. Sempre que algum gestor, independente do prefeito ou secretário, procura a gente, colocamos nosso corpo técnico à disposição. Apoiamos dentro do nosso fôlego. Essa é nossa obrigação enquanto Universidade vinculada à cidade e à comunidade.”

Barulho em frente ao Campus
“É uma situação de longa data e que se agrava a cada dia. O entorno da Universidade é usado como point de jovens universitários não só da Católica, mas da cidade inteira. Os moradores dos arredores nos creditam toda a culpa nesse processo. Por isso acionamos o Ministério Público. O que ocorre de grave nisso é que aulas são prejudicadas. O serviço educacional não combina com álcool e drogas. Tudo o que é possível está sendo feito. Na verdade, como existe um Código de Posturas municipal ele deveria ser aplicado pelas autoridades. Isso não quer dizer que não possa ter no fim da aula um lugar para tomar um chope, mas é que extrapolou todos os limites. Se perdeu a noção de que isso aqui é uma instituição de ensino. E os próprios gestores públicos parecem ter medo de tomar uma atitude definitiva por não quererem desagradar esse povo.”

Professores
“Para manter o título de universidade a instituição tem que ter professores extremamente qualificados. A Universidade, de 1 a 5, ela é nota 4 (pelo Ministério da Educação). Pra isso, 33% de corpo docente precisa ser de mestres e doutores. Nos últimos dois anos perdemos 50 professores desse nicho para concursos públicos. Aí tivemos que abrir concurso chamando gente do país inteiro para manter o padrão de educação que a Universidade exige. Durante o ano de 2012 implantamos um novo plano de carreia docente. A grande diferença desse plano é que o professor passou a ser gestor da sua carreira acadêmica. Isso determina o crescimento dele. Quem se dedica, cresce. Quem não se dedica, fica no crescimento vegetativo que todo plano tem. Ainda estamos no início da fase prática porque o plano entrou em vigor no fim de 2012, início de 2013, e isso é pouco tempo. As pessoas ainda estão se adaptando.”

Pós-graduação
“Quando assumimos a Universidade, tínhamos apenas quatro cursos de pós-graduação lato sensu em andamento. Então tentamos sensibilizar nossos professores para que criassem novas especializações. Hoje já contamos com 21 cursos novos, além dos antigos. Dificuldade: retomar o mercado. Nós temos hoje na cidade dezenas de ofertas de lato sensu a distância, o que dificulta a nossa reentrada no mercado. Mas nossa meta é chegar ao fim do ano com pelo menos 35 cursos ofertados. Naqueles cursos de graduação onde o corpo docente não teve interesse ou não conseguiu montar especialização, nós estamos buscando com pessoas de fora que tenham interesse em vincular o curso com a estrutura da Universidade.”

Cursos com problemas?
“Eu não pretendo fechar nenhum curso na Universidade. Alunos que hoje estudam em turmas reduzidas podem ficar tranquilos. Se existir uma turma com um só aluno, ele vai sair daqui com diploma. O que eu prometo é que eu não vou abrir curso com dez alunos, isso eu não vou fazer. Se eu não tiver aluno, automaticamente eu não tenho curso. O estudo mercadológico do curso de Odontologia (incluso no vestibular de verão, mas que não saiu do papel) era muito interessante. Ele foi um dos mais procurados, mas aí ocorreu um fenômeno. Na hora da matrícula não tivemos o resultado que o vestibular mostrava. No fim ficamos aquém dos 85% de alunos necessários e não poderíamos ser irresponsáveis de dar início a um curso cujo prejuízo já seria projetado. Um plano estratégico não é sinal de sucesso. Ele nos orienta. Mas nós não abandonamos o projeto da Odonto e vamos reapresentar o curso.”

Promessas?
O que eu posso prometer é trabalho. Porque essa casa precisa de comprometimento, de muito trabalho e dedicação não só dos seus gestores, mas de cada aluno, de cada professor e de cada pessoa da comunidade que por aqui passou e deseja olhar para trás e sentir orgulho. “Eu fiz parte disso, isso me ajudou, tenho meu valor pessoal mas lá eu encontrei alguém que mudou o meu rumo.” É isso que a gente promete como reitoria para os próximos dois anos.

Legado
“A construção de uma equipe saudável vai garantir que o próximo reitor que sentar aqui possa dizer: 'Agora vamos construir um hospital regional. Temos um terreno, temos estrutura e agora - como estamos com as contas pagas - temos condições de ter financiamento para isso'. É uma construção que cabe a essa equipe. A parte inicial é reestruturação, é base, é treinamento. Eu tenho certeza, tenho convicção, de que ao meu mandato cabe o ônus de toda essa mudança, desse desgaste de imagem na tomada de ações antipáticas, mas isso é uma missão que eu recebi e vou cumprir da melhor forma possível para que o próximo reitor colha os frutos de tudo isso.”

E-MAIL

Você pode ser um colaborador.

Envie suas sugestões para o e-mail :

pelotasdeportasabertas@hotmail.com

" Povo que reivindica seus direitos é melhor respeitado."