Leitor e comentador assíduo deste site, o internauta que se identifica como Felipe X em geral não concorda com as abordagens das matérias e as posições assumidas pelo Sul21. As críticas que posta mais de uma vez ao dia como comentários em nossas páginas são, por vezes, ferozes e, quase sempre, vão em direção oposta ao ponto de vista do jornal.
Hoje (15), entretanto, Felipe X postou um comentário em perfeita sintonia com a posição do Sul21 e que, por sua clareza e capacidade de síntese, merece ser transcrito aqui. A respeito da decisão da juíza da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre, que determinou que o atropelador dos ciclistas da pedalada promovida pela Massa Crítica na noite de 25 de fevereiro de 2011 seja julgado por júri popular, respondendo pela acusação de 17 tentativas de homicídio qualificado, Felipe X postou, ao final da matéria do Sul21, o seguinte comentário:
“A decisão faz sentido, mas o que me chateia é que a vontade por sangue é maior do que a discussão sobre soluções. Este motorista deveria ter perdido sua carteira de habilitação há muito tempo! Já tinha sido multado até por andar em cima da calçada. Está na hora da CNH ser vista realmente como uma licença e não como um direito básico. O governo tem parte de culpa neste crime.”.
Sem que se minimize a gravidade dos atropelamentos em pauta, merecem reflexão as afirmações implícitas na postagem de Felipe X de que 1) a indignação pública se apega ao fato em si e exige punição de quem o praticou, mas 2) parece não se indignar com a leniência das punições sobre as faltas aparentemente menos graves cometidas diuturnamente por centenas de motoristas.
Se os condutores de veículos motorizados que cometem abusos e exibem comportamento agressivo ao dirigir fossem punidos com mais rigor e suas Carteiras Nacionais de Habilitação (CNH) recolhidas tão logo eles atingissem o limite de pontuação tolerado por infrações e, ainda, se os motoristas que atropelam e matam quando dirigem embriagados, na contramão e/ou em excesso de velocidade, fossem punidos com rigor, certamente as infrações diminuiriam e as morte e atropelamentos no trânsito teriam redução significativa.
No Japão, para se citar um exemplo extremo, quem comete faltas no trânsito e é multado por isto é considerado um indivíduo antissocial e seu comportamento repreendido pela maioria, pois se entende que sua(s) atitude(s) coloca(m) em risco a vida e o bem-estar de toda a comunidade.
Indo mais além das punições, no entanto, é chegado o momento de o poder público, de todos os níveis, rever a prioridade que vem dando desde os anos 50 do século passado ao transporte rodoviário e à locomoção por meio de veículo motorizado individual e particular. Hoje, as vias públicas estão abarrotadas e, em decorrência da melhoria dos rendimentos das famílias e das facilidades de financiamento de veículos, tendem a se tornar cada vez mais intrafegáveis. Os deslocamentos tornam-se cada vez mais lentos e os motoristas cada vez mais estressados.
Sem que se analise aqui a irracionalidade da política de transporte de cargas adotada ainda hoje no Brasil e tratando apenas do transporte de passageiros, bastam alguns cálculos aritméticos simples para se perceber quão absurda é a política de incentivo ao consumo de veículos motorizados para o transporte de pessoas no país. Em média, os carros de passeio pesam entre 700 kg e 900 kg e transportam 1 e ½ passageiro por veículo, que pesam, em conjunto, cerca de 105 kg e se deslocam, nas grandes cidades, a uma velocidade média de 10 a 12 km horários. Considerando-se que um ônibus urbano e um vagão de metrô transportam 60 passageiros, o primeiro, e 75 passageiros, o segundo, são necessários 40 ou 50 carros para transportar o que apenas um ônibus urbano ou um vagão de metrô transportam consumindo muito menos combustível e, no caso do metrô, a uma velocidade média três ou quatro vezes maior e, o que é ainda melhor, agredindo muito menos o meio ambiente.
Para que ocorra a mudança da política de transporte de passageiros atualmente existente no Brasil, é preciso que cresça não apenas a Massa Crítica e os demais movimentos de incentivo ao uso de bicicletas e de veículos de transporte coletivo, mas é fundamental que cresça também, e muito, a capacidade de gestão dos governantes e a consciência crítica do conjunto da população. A realidade do trânsito das grandes cidades do Brasil, hoje, exige uma legislação mais rigorosa e sua efetiva aplicação, mas exige também uma mudança radical na política de transportes vigente no país.
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