Somente nos primeiros meses de 2013, são contabilizadas cinco mortes por dia devido a acidentes de trânsito
Seiscentas e dezenove vidas, 619 sonhos, 619 famílias, 619 tragédias. Nos primeiros quatro meses deste ano, 619 pessoas perderam a vida no trânsito, segundo recente levantamento do Departamento Estadual de Trânsito do Rio Grande do Sul (Detran/RS). Esse dado representa a média de 154 mortes por mês, ou cinco por dia. É um óbito a cada pouco mais de quatro horas. As marcas deixadas pelo trânsito, como a banalização das mortes, o custo aos cofres públicos e o drama de quem tem de viver com a perda de um familiar ou as mudanças com as sequelas serão abordados ao longo da série de reportagens Guerra Silenciosa, que será publicada deste domingo até quarta no Correio do Povo.
A situação mais alarmante e preocupante é que na véspera de completar quatro meses da tragédia da boate Kiss, em Santa Maria, em que 242 perderam a vida, o trânsito já ceifou praticamente o mesmo número de jovens. As vítimas fatais com idades entre 18 e 34 anos — mesma faixa etária dos frequentadores da Kiss — somam 237. A grande diferença é que as mortes do trânsito ocorrem a “conta-gotas” e, diante de tantos números e estatísticas, crescem assustadoramente e sem parecer ter fim, a comoção praticamente não existe ou é sufocada pelos sucessivos acidentes e mortes.
“É apenas mais um caso, foi o que ouvi uma autoridade dizer quando fui buscar justiça pela morte dos meus pais em um acidente de trânsito”, desabafa Raquel Fior, 28 anos. Para se ter uma dimensão do problema, em único final de semana, o do Dia das Mães, 35 pessoas perderam a vida. As famílias das vítimas fatais ou aquelas que ficaram com sequelas tentam reconstruir suas vidas diante das novas perspectivas transformadas completamente pelos acidentes.
O coordenador do Comitê Estadual de Mobilização pela Segurança no Trânsito, vice-governador Beto Grill, reconhece a banalização da população em geral com o assunto. “É preciso incorporar à vida das pessoas os riscos reais provocados pelo trânsito. Elas acham que nunca vão sofrer um acidente”, avalia. Para mudar essa realidade dramática, ele defende a união de esforços de todas as esferas — públicas e privadas. “Uma ação isolada não surtirá efeitos. É preciso atuar em várias frentes, desde o rigor na fiscalização como as ações de conscientização. Uma campanha isolada não resolverá o problema”, afirma Grill.
O diretor-presidente do Detran/RS, Leonardo Kauer, acredita que há um risco muito grande quando as mortes são vistas simplesmente como dados estatísticos, sem o contexto familiar e social da vítima. “São planos interrompidos.” Para enfrentar essa situação, cita ações como as operações Balada e Viagem Segura e cobra o apoio do cidadão. “Precisamos compartilhar as responsabilidades.” A boa notícia é que as campanhas estão surtindo efeito. Na comparação entre 2012 e 2013 houve redução de 6,2% em mortes. Nos quatro primeiros meses do ano passado, foram 660 vítimas fatais.
40% dos acidentes no fim de semana
Nos quatro primeiros meses do ano, de acordo com o levantamento do Departamento Estadual de Trânsito (Detran/RS), a maior parte dos acidentes com vítimas fatais se deu por colisão (39%). Também é elevado o número de ocorrências de atropelamentos (23%) e colisão lateral (11%). O motociclista é a principal vítima da carnificina do trânsito, representado 27% do total de mortos. O motorista aparece na sequência, com o segundo maior percentual.
Em média, um em cada quatro mortos era o condutor do veículos. O pedestre aparece em terceiro, representando 21% dos óbitos em acidentes. Os automóveis e as motocicletas são os dois veículos que mais se envolvem em acidentes, respectivamente 36% e 24%. A distribuição dos acidentes pelos dias da semana mostra uma curiosidade: 40% deles ocorrem nos finais de semana. De segunda a sexta, a média/dia fica em 12%.
Não há uma grande concentração em relação ao turno. O maior percentual é à noite (30%). À tarde, ocorreram 27% das ocorrências, pela manhã, 25% e na madrugada, 17%. Em cinco acidentes não foi identificado o horário (1%).
Os homens ainda são os que mais perdem a vida no trânsito. São 77%. As rodovias federais e estaduais concentram 60% dos acidentes. Os outros 40% foram nas vias urbanas. Apenas em Porto Alegre foram contabilizadas 38 vítimas fatais.
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