Grampo em celular de menina desaparecida detonou inquérito inédito na Grã-Bretanha
Jornalistas invadiram caixa de mensagens da jovem Milly Dowler, que estava desaparecida |
O juiz que liderou o maior inquérito já feito na Grã-Bretanha sobre a conduta da imprensa vai publicar nesta quinta-feira o relatório com as conclusões de sua investigação.
O documento produzido pelo Lorde Brian Leveson – depois de oito meses de investigações – deve levar a uma discussão entre legisladores britânicos para reformulação das leis que regulam a imprensa no país.
A imprensa britânica é autorregulada por um órgão conhecido como Comissão de Reclamações sobre Imprensa (PCC, na sigla em inglês), que tem poderes apenas para fazer recomendações e é custeado pelos próprios veículos de comunicação. Mas algumas pessoas que foram vítimas de abusos recentes da imprensa estão pedindo a criação de um órgão regulador com financiamento independente e com maiores poderes para multar e punir jornalistas e veículos.
Milly Dowler
O estopim do Inquérito Leveson foi um escândalo envolvendo o tabloide News of the World e a morte de uma adolescente de 13 anos chamada Milly Dowler.
Relatório de Leveson deve recomendar criação de agência reguladora para imprensa britânica |
Dowler desapareceu em março de 2002, mas seu corpo só foi encontrado seis meses depois. Na época, repórteres do News of the World conseguiram invadir a caixa de mensagens do telefone celular da adolescente.
A caixa estava lotada, e os repórteres do tabloide apagaram algumas das mensagens – na esperança de que novas mensagens pudessem ser gravadas, gerando novas pistas sobre o paradeiro da jovem. No entanto, a polícia e a família de Milly Dowler, ao perceberem a atividade na caixa de mensagens do celular, chegaram a acreditar que ela ainda estivesse viva. A invasão de privacidade ilegal feita pelos repórteres do tabloide só foi revelada no ano passado pelo jornal britânico The Guardian. O escândalo fez com que o magnata da mídia Rupert Murdoch, proprietário do News of the World, decidisse fechar o tabloide. A revelação também contribuiu para que o premiê britânico, David Cameron, estabelecesse o inquérito, conhecido no país como Leveson Inquiry, que analisou diversos casos de abusos cometidos pela imprensa. Durante oito meses, diversas celebridades que sofreram com abusos da imprensa – com seus telefones grampeados ou privacidade invadida de outras formas ilegais – foram ouvidas, como Hugh Grant, Sienna Miller, Max Mosley e JK Rowling
A investigação sobre a imprensa britânica teve repercussões também na política. O diretor de comunicação do premiê britânico, Andy Coulson, deixou seu cargo no governo. Neste mês, ele foi indiciado por pagar propina a policiais e autoridades em troca por informação. Os casos aconteceram quando Coulson era editor do News of the World.
Reformas
Mas as consequências mais profundas do Inquérito Leveson devem começar a aparecer a partir desta quinta-feira, quando o juiz divulgará seu relatório. O documento com centenas de páginas deve fazer críticas a jornalistas, políticos e policiais. Existe a expectativa de que Leveson recomendará a criação de uma agência reguladora da imprensa britânica com maiores poderes. Mas essa possibilidade é polêmica entre jornalistas, donos de veículos e até mesmo dentro do governo britânico.
Hugh Grant foi uma das testemunhas do inquérito, que durou oito meses |
A coalizão que governa o país está dividida.
O premiê David Cameron é contra a criação do órgão de regulação. Mas o líder do partido Liberal Democrata, o vice-premiê Nick Clegg, estaria mais inclinado a acatar a recomendação. Clegg e Cameron receberam uma cópia do relatório na quarta-feira – 24 horas antes da divulgação oficial – e passaram o dia reunidos para discutir o assunto.
O analista político da BBC, Nick Robinson, afirma que a decisão de Cameron sobre esse assunto está entre as mais difíceis de toda a sua gestão, por envolver interesses de setores poderosos da sociedade e devido à falta de consenso dentro da coalizão – o que poderia provocar uma crise política. Uma pesquisa recente feita pela rádio BBC Radio 5 live revelou que dois terços dos adultos britânicos não confiam – ou confiam pouco – no que leem nos jornais. Quase metade dos entrevistados disse que gostaria de ver um controle maior da imprensa por parte da Justiça.
Não perca a hora : pelotasdeportasabertas@hotmail.com