Por: Fábio Braga, médico
Ter um carro e a autonomia do transporte individual é um sonho que trazemos da juventude. Os ônibus só fazem os trajetos aprovados pelo Poder Público. A moto dá liberdade, polui e custa menos, mas é o mais perigoso meio de transporte que existe. Além do capacete, seu condutor só pode contar com a proteção da roupa e com sua pele. Quando chove ou faz frio, a velocidade aumenta o desconforto e o perigo. O motoqueiro disputa em desigualdade as vias com os carros e ônibus, aproveitando brechas, ziguezagueando e, frequentemente, se acidentando. As estatísticas são cruéis a este respeito.
A bicicleta não é rápida como a moto, o ciclista não tem a proteção do carro e também se expõe ao clima. Apesar disto tem inúmeras vantagens. Não usa combustível poluidor, seu custo de manutenção é mínimo, não congestiona o trânsito, no espaço que um carro ocupa numa rua podem trafegar seis ciclistas, no espaço que um carro ocupa para estacionar cabem 20 bicicletas e, apesar de lenta, em média, multiplica por três a velocidade de deslocamento de um pedestre. Como a velocidade é menor, os acidentes costumam ser menos violentos. Em relação à saúde, melhora o condicionamento físico de seus usuários e contribui para diminuir as doenças cardiovasculares, a osteoporose, a artrite e ainda melhora o sistema imunológico de quem pedala.
Em outros países, longe de ser algo do passado a bicicleta é do futuro. Na Holanda um terço de todos os trajetos urbanos é feito de bicicleta; na Dinamarca são 18% dos trajetos e no começo das manhãs em Copenhagen, já vi ciclistas de terno e gravata, indo para o trabalho; na Alemanha 10% dos trajetos são feitos de bicicleta. A China tem 470 milhões de bicicletas mecânicas e cem milhões de bicicletas motorizadas. Nos Estados Unidos 70% dos departamentos de polícia usam patrulheiros de bicicleta, que fazem 50% mais prisões que os patrulheiros motorizados. Nova York tem 1,6 mil quilômetros de ciclovias. No Rio de Janeiro se pode alugar bicicletas num ponto da orla e entregá-la noutro, fazendo belos passeios nas principais praias da Zona Sul.
Pelotas é uma cidade plana, com um trânsito que piora a cada dia em função da facilidade de aquisição de carros e motos. Sonhos se realizam, mas são as mesmas ruas, da mesma largura, com os mesmos buracos e com sinalização deficiente, todavia com muito mais veículos. Os acidentes, os congestionamentos, a lentidão, a dificuldade de estacionar e o estresse aumentam cada vez mais. Temos condições ideais para usarmos mais bicicletas, mas precisamos mudar a mentalidade das pessoas. Bicicleta não deve ser encarada como um recurso de quem é pobre. Optar por andar de bicicleta deve ser algo como optar por parar de fumar, algo lúcido e sadio. Precisamos de uma política de incentivo, legislação protetora e um sistema de ciclovias que permita os deslocamentos para qualquer lugar com segurança e não apenas ciclovias isoladas.
Em Pelotas podemos fazer alguns trajetos, mas dificilmente se pode ir a algum lugar de bicicleta sem enfrentar o perigo do trânsito fora das ciclovias. Quem anda de bicicleta praticamente não tem onde deixá-la quando vai trabalhar. Em Amsterdã no centro da cidade, em frente a sua lindíssima estação de trens, há um imenso estacionamento para bicicletas. Poderíamos ter algo assim no largo entre o Mercado Central e a prefeitura, bem como em várias praças.
Já há um começo desta conscientização em nossa cidade, grupos de ciclistas se formam e crescem, mas o poder público tem que participar viabilizando seu uso. O Plano Cicloviário da cidade prevê a instalação de 63,7 quilômetros de ciclovias, segundo reportagem deste Diário de 17 de julho. É bom, mas é pouco. Sem condições, andar de bicicleta é perigoso para o condutor. Os moradores das ruas onde se pretende criar ciclovias não gostam da ideia. Perdem vagas de estacionamento na frente de casa, mas também terão benefícios. Pelotas tem sido inovadora em várias áreas e pode ser nesta também. Viveremos numa cidade melhor.
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